domingo, 28 de fevereiro de 2010

o sol através do vidro

... ou os tentáculos da lua.

Amor é um pouco como água. Um pouco como vento, um pouco como barulho. Tão fácil de ler se os olhos estão atentos, meu bem, tão claro. Nasce do turbulento, do calmo, do caos e da leveza, em todos os lugares, por acaso, em um tempo incontável e não linear, escondido no espaço, assim como o momento em que tua cabeça se chocou contra meu muro e o universo nos abraçou como filhas. Minha pele ainda arde, mesmo depois dos dias, das semanas, dos meses; arde porque tua humanidade se encontrando com a minha foi armadilha sem razão alguma, fez fogueira nos teus olhos tão escuros e agora queima queima queima fazendo de nós fumaça, nos transformando lentamente em cinzas. Logo nós duas, minha querida, tão parecidas, tão inocentes, iguais na alma e no corpo, tão pequenas...
Surda. Surda – era o que você estava no primeiro momento em que chamei teu nome e ninguém me respondeu. Eu te amo; é o que me lembro de ter dito, mas estava só, tão só quanto apenas os seres humanos conseguem ser, e houve eco. Minha voz sendo obrigada a voltar e a entrar à força nos meus próprios ouvidos, rasgando minha cabeça de uma ponta a outra, me lembrando que sou a única habitante de um mundo estranho que conheci por culpa da solidão.

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

um solo solitário

though i said some things to hurt you
well it was only out of fear

(Paul McCartney)

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

suor, despedida

eu queria tanto ter dado aquele beijo
que se perdeu no meio do caminho.

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

Nas sombras.

A pasmaceira corrói minhas arestas como se fossem dentes afiados e famintos que já não sabem mais onde procurar por alimento. O pó sobre todas as nossas coisas, sobre o que não consegue ser mais forte, sobre nós, sobre você. A contagem é regressiva, meu bem, nem tudo pode esperar para sempre. Nem tudo é feito de aço, como eu. Mil caíram a minha esquerda e dez mil a minha direita e ainda que eu não tenha sido atingida, me fere de morte a visão de todos estes cadáveres que se foram sem que eu pudesse mover um dedo. A estagnação me causa torpor. Euforia de não agüentar mais estar sempre parada a espera de uma salvação que teima em não chegar. De noite, as estrelas; pela manhã, o rosto cansado, teu sorriso e a certeza de que tua alegria não tem só nome, mas também preço. Dias longos e o nascer do sol nunca esteve tão próximo da noite – a memória que apaga o que não tem tua lembrança entrelaçada. O coração gelado e todos estes meus sentimentos estragados, como o leite que azedou dentro do copo de tanto esperar por quem o tomasse, e de repente o ciclo chega ao seu fim (começo) outra vez... minhas cartas sem destinatário, data, endereço. Tudo jogado ao vento num súbito surto porque, meu amor, sabe que és apenas humana e tuas limitações são muitas, incontáveis. O peso que cai por cima de teus ombros é imensamente maior do que teu corpo sem estrutura pode agüentar e não é surpresa tua queda. Dentre as tantas quedas que tentei impedir, te segurar no ar, estar no chão junto contigo. I’m not on your shoes, dear, mas tenho teu peito perto o suficiente pra saber quanto sangue estancado há dentro dele. Deixe que as feridas sangrem, meu Deus, permita que as feridas não tenham mais tamanho de tão grandes. É bom que doa, aprende, porque depois da dor vem o clarão que te cega é tudo leve, sereno, mais calmo. Como deve ser. Mesmo que nada esteja em seu devido lugar, minha querida, não se deve deixar que o tédio consuma o pouco que resta. Lutamos com as armas que possuímos, eu, eles, todos nós, quem eu tenho perto e o resto da humanidade. O instinto de sobrevivência é maior porque a vida explode sua imensidão dentro de mim e eu não quero desperdiçar nenhum segundo sequer ao teu lado.
Tenho os pés inchados, tênis sujos de barro, uma expressão mais enrugada do que deveria e dedos amarelos por pensar demais. Usar tanto a mente não é saudável ao corpo e pensar além do que se é natural não é bom para o amor. Não importa o que façamos, ao final o mundo decide por nós, e a mesma avalanche sem fim de tempo que me arrastou para perto de você que agora te leva para cada vez mais perto do tufão que jamais deixará que fenômeno natural algum te traga de volta. E o que eu faria, meu amor? O que eu faria então sozinha e perdida sem você, que me salvou de tantas danações? Não deixe que a ponte desmorone comigo em cima e nem que a tragédia irreversível que está a caminho chegue mais perto. Sê por mim metade do que sou por você.
Os céus sabem que sempre acabo por ceder porque sou frágil e fraca, não me envergonho. Sou uma apaixonada qualquer, não diferente de tantas outras e outros que estão tão desesperados quanto eu, caminhando sem cessar pelas ruas caçando respostas para suas perguntas até em pedaços quebrados de asfalto. Corações estilhaçados, nervos a beira do abismo, a loucura nos convidando para um café, o medo da altura. A vertigem, tão familiar, sempre tão certa quanto tudo o que arranco de mim e escrevo para ninguém. Não me coube escolher, da mesma forma que não te cabe meter o dedo no meio da história para tentar decidir o que virá pela frente. É somente entender que existindo dois lados é preciso saber para qual deles ser mais fraca. Difícil é sentir falta, a ausência te cercando por todos os lados, não saber o que fazer com as próprias mãos. Porque por mais que eu role pelas lamas da vida, sabes melhor do que ninguém, minha querida, que tudo posso naquilo que me fortalece. Eu vou para o lado do amor e não abro.